Empresas de tecnologia têm de agir na Covid-19

Coluna semanal do Ronaldo Lemos publicada na Folha de São Paulo.

publicado em

24 de março de 2020

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Um dos poucos aspectos positivos da crise atual é que ela precipita a colaboração entre pessoas comprometidas a trabalhar em soluções emergenciais. Isso aconteceu, por exemplo, no setor de tecnologia.

Boa parte das lideranças do setor no Brasil está desde meados da semana passada unida em grupos formados na internet, debatendo ações que podem ser tomadas para que a tecnologia ajude neste momento difícil.

Listo abaixo algumas das propostas que emergiram dessa conversa até agora. Todos os pontos estão em aberto para sugestões e aperfeiçoamento. Para lidar com uma crise dessa magnitude, é preciso dados.

Nesse sentido, vale lembrar que as teles e outras empresas de tecnologia têm hoje condições de estabelecer a localização precisa de cada pessoa que possui um aparelho de celular e seus deslocamentos.

É possível usar essa informação —respeitando a privacidade— para tomar medidas que auxiliem o isolamento social e também para garantir o funcionamento sem interrupções de serviços essenciais
que não devem parar.

As teles e todas as empresas que possuem dados como esse precisam desde já criar protocolos imediatos para dar acesso a essas informações diretamente aos governos estaduais e municipais, que são quem têm a responsabilidade de coordenar esse esforço ao nível local.

Outro ponto essencial é a questão do fluxo de pagamentos, assegurando que as pessoas mais pobres tenham acesso a auxílio de renda emergencial. Nesse contexto, vale lembrar que um em cada três brasileiros não tem conta bancária. São justamente os mais vulneráveis.

Para eles, é preciso soluções imediatas. Por exemplo, acelerar o processo de implementação de pagamentos digitais via redes sociais e WhatsApp, que estavam em curso. E também utilizar a estrutura de créditos de celular —hoje onipresente para quem tem conta de celular pré-paga— para transferir dinheiro. Isso já acontece há anos no Quênia e em outros países. Pode ser implementado em caráter de urgência no Brasil com grande efetividade.

Outra questão é garantir à população mais carente o acesso básico a comunicação. A maioria das pessoas, apesar de ter celular, não tem internet assegurada.

Nesse sentido, liberar o acesso universal e gratuito ao WhatsApp durante o período da crise (e outras redes sociais amplamente usadas) —mesmo que de forma básica, permitindo acessar só texto e áudio— é medida essencial que as empresas de tecnologia, ao lado das teles, podem e deveriam fazer imediatamente. Ou ainda assegurar cobertura 3G universal e aberta neste período. São medidas essenciais.

Outro desafio —como apontado por Armínio Fraga e Marcos Lisboa— é garantir o lado da oferta. De nada adianta ter R$ 200 a mais por mês se não há o que comprar com esse dinheiro.

As empresas de tecnologia atuando em logística reversa podem contribuir nisso, como Eu Entrego, sem falar no Rappi, na Loggi, na CargoX e em todas as empresas de online to offline (O2O) do Brasil.

Felizmente, essa conversa já começou. Uma das medidas será criar pontos de armazenamento e coleta auto-organizados para facilitar a distribuição, como aconteceu na China. E também, como a China demonstrou, contar com as empresas locais de tecnologia é fundamental para sair
desse desafio enorme.

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