Clássicos como ‘Reinações de Narizinho’ estão livremente acessíveis

Coluna semanal do Ronaldo Lemos publicada na Folha de São Paulo.

publicado em

15 de janeiro de 2019

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Dia 1º de janeiro não é apenas dia de celebrar a virada de ano. É também o dia em que as criações artísticas e intelectuais são promovidas ao domínio público.

Esse é um momento importante, porque as obras deixam de ser exclusivas dos seus titulares e passam a ser de livre acesso e uso por qualquer pessoa. No Brasil, a proteção pelo direito autoral dura 70 anos, contados a partir de 1º de janeiro do ano seguinte à morte do autor.

Em 2019, o time de obras que entraram em domínio público é peso-pesado. No Brasil, ninguém mais, ninguém menos do que Monteiro Lobato —morto em 1948— teve sua obra inteira promovida ao domínio público.

Clássicos da literatura brasileira como “Reinações de Narizinho”, “Caçadas de Pedrinho”, “A Chave do Tamanho” e “Urupês” estão agora livremente acessíveis.

Quando uma obra cai em domínio público, isso significa que ela pode ter livre uso por qualquer pessoa, sem a necessidade de solicitar autorização. A obra pode ser editada, publicada na internet, adaptada para o cinema ou televisão, traduzida, transformada em peça teatral e assim por diante.

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O escritor brasileiro José Bento Monteiro Lobato, morto em 1948 – Arquivo Pessoal

Faz sentido que seja assim. O próprio Monteiro Lobato bebeu sofregamente na fonte do domínio público para realizar sua obra. “Os Doze Trabalhos e Hércules” e “O Minotauro” são alguns grandes exemplos.

Nada mais justo que, agora, outros escritores e criadores possam beber na fonte do seu trabalho. Vale torcer para que haja uma renascença da sua obra, que agora pode ser não só reeditada mas também reinventada.

Mais do que isso, 2019 é importante porque marca o fim da “moratória” do domínio público que aconteceu nos Estados Unidos. Explico. Em 1998, os EUA tomaram uma decisão bizarra de aumentar o prazo de proteção do direito autoral em 20 anos, expandindo a proteção para 95 anos.

Essa controversa decisão foi tomada para proteger Mickey Mouse, cuja versão mais antiga aparece no desenho animado “Steamboat Willie”, que cairia em domínio público em 2004. Em razão disso, um forte lobby fez com que o Congresso dos EUA ampliasse a proteção por mais 20 anos.

Só que, ao impedir que Mickey fosse promovido ao domínio público, essa mudança preveniu também que um amplo conjunto de obras seguisse o mesmo caminho. Em outras palavras, a humanidade teve de esperar por 20 anos para que os poemas de Robert Frost ou obras de F. Scott Fitzgerald finalmente voltassem a se aproximar do domínio público.

Pois bem, o momento chegou, e a partir de 2019 começam a entrar em domínio público criações essenciais. Na safra deste ano, temos “Os Dez Mandamentos”, de Cecil B. DeMille, os livros “Assassinato no Campo de Golfe”, de Agatha Christie, e “Mrs Dalloway”, de Virginia Woolf. Ou ainda as “Sonatas para Violino 1 e 2”, de Béla Bartók.

Em 1º de janeiro de 2020, entra em domínio público “Rhapsody in Blue”, de George Gershwin, música que se tornou um hino universal da cidade de Nova York.

Em outras palavras, todo início de ano é tempo de dizer não só “feliz ano novo” mas também “feliz domínio público”. É esse instituto que permite que o legado de uma geração seja transmitido para outra.

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