Propriedade Intelectual na Indústria Criativa: Uma obra democrática

Review de Pedro de Abreu M. Campos

publicado em

15 de abril de 2020

categorias

{{ its_tabs[single_menu_active] }}

tema

Lawrence Lessig (2006), em sua “teoria do ponto patético”, identifica quatro formas de regulação: leis, mercado, arquitetura/código e normas sociais. A regulação da Propriedade Intelectual por meio de normas sociais remonta à Antiguidade, quando a opinião pública já desprezava plagiadores. Mais adiante, com o Estatuto da Rainha Ana, de 1710, inaugurou-se o estágio embrionário de regulação da Propriedade Intelectual por meio das leis (PARANAGUÁ, BRANCO, 2009). De lá para cá, o mundo e suas tecnologias mudaram e se desenvolveram muito, bem como as regulações sociais, mercadológicas e arquitetônicas sobre a Economia Criativa. Contudo, o mesmo não pode ser dito sobre a regulação legislativa da Propriedade Intelectual, de acordo com o trabalho aqui resenhado.

O livro “Propriedade Intelectual na Indústria Criativa”, de autoria de Daniel Chalhub, Rodrigo Cid e Pedro de Abreu M. Campos, lançado em 2019, no Rio de Janeiro, pela Editora Lumen Juris, introduz conceitos tradicionais da legislação de Propriedade Intelectual e suas funcionalidades originais. Utilizando de linguagem acessível – sem juridiquês – os autores argumentam que institutos como Direitos Autorais, Direitos Conexos, Marcas e Patentes, foram arquitetados a partir de uma lógica de exclusão e, por isso, se tornaram obsoletos na atualidade.

O argumento central é que depender das ferramentas tradicionais de proteção da Propriedade Intelectual não é suficiente para produzir a indústria criativa e gerar valor. Cada vez mais, a proteção de obras artísticas, autorais, industriais e científicas deixa de ser um mero direito de excluir terceiros e se torna um ativo do bom empreendedor. Em um mundo em que o conteúdo é a mercadoria, é preciso buscar conectividade e inclusão, não exclusão.

Com exemplos concretos – e a obra é recheada deles – os autores demonstram as formas que os integrantes da Economia Criativa encontraram para fazer as “velhas ferramentas” da Propriedade Intelectual funcionarem. Em relação aos direitos autorais, exemplos envolvendo o pintor Leonid Afremov, o fenômeno das fanfictions e dos códigos em open source demonstram como é possível criar valor a partir da lógica do acesso, não da exclusão. Ao mesmo tempo, a insistência de alguns players em restringir os acessos tem se mostrado como um tiro pela culatra. Afinal, a regulação por meio da lei pode estar ao lado dos titulares que desejam excluir. Mas, a regulação por normas sociais vem passando por profundas modificações no sentido de, cada vez mais, os usuários demandarem acesso aberto.

No mundo das marcas, os autores argumentam que tais símbolos nunca foram apenas insígnias capazes de gerar a distinção de um produto. A utilização criativa e eficiente da marca pode ser benéfica e até mesmo ajudar a enfrentar falsificações. É o que demonstra, por exemplo, o caso da coleção da grife Versace em parceria com a rapper M.I.A. Ou, ainda, o curioso caso da marca de mostarda Grey Poupon, que passou por um contexto de valorização similar à Catuaba Selvagem, se associando a ricos movimentos da Economia Criativa.

A mesma narrativa é utilizada para demonstrar como a Indústria Criativa vem lidando com a obsolescência de outras ferramentas tradicionais de Propriedade Intelectual. Assim, além de tratar de aspectos de Direitos Autorais, Software e Marcas, os autores desenvolvem argumentos similares em relação aos Desenhos Industriais, às Indicações Geográficas, Conhecimentos Tradicionais, Patentes e Segredos Industriais.

Após navegar pelas formas como a Economia Criativa vêm encontrando para gerar valor, mesmo que em contradição com a lógica subjacente à regulação legislativa dos direitos de Propriedade Intelectual, os autores analisam novas ferramentas e soluções encontradas na Indústria Criativa.

Desde institutos mais difundidos, tais como as licenças em Creative Commons, até o inusitado estudo sobre Drag Queens e seus “Acordos de Damas”, os autores sugerem que diante de uma legislação antiquada, a Indústria Criativa segue seu caminho sem pestanejar, construindo suas próprias soluções a partir de uma regulação muito intensa do mercado, das normas sociais e dos códigos/arquiteturas.

Assim, portanto, se as antigas proteções se mostram inadequadas em várias medidas, os profissionais criativos têm feito aquilo que fazem de melhor: encontrado soluções pouco óbvias. Essas soluções, além do uso novo para as velhas ferramentas, passam pela criação de novas ferramentas.

O argumento central da obra “Propriedade Intelectual na Indústria Criativa” não é plenamente novo ou mesmo inovador. O verdadeiro mérito do livro está na forma como apresenta o debate de forma simples e acessível para profissionais de todas as áreas. O uso de exemplos interessantes – esses, sim – bastante originais e únicos, torna a obra lúdica, leve e divertida, tornando o livro atraente para aqueles com os mais diversos interesses e conhecimentos pregressos.

 

Gostou da leitura e quer se aprofundar neste tema? Inscreva-se no conheça o curso online sobre Propriedade Intelectual e Inovação que contou com a participação dos autores desta obra.

 

Bibliografia

BRANCO, S.; PARANAGUÁ, P. “Direitos Autorais”. Rio de Janeiro: Editora FGV DIREITO RIO, 2009.

CHALHUB, D.; CID, R.; CAMPOS, P. “Propriedade Intelectual na Indústria Criativa”. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2019.

LESSIG, L. “Code: Version 2.0”. New York: Basic Books, 2006. Disponível em: http://codev2.cc/download+remix/Lessig-Codev2.pdf

{{ pessoas.pessoaActive.title }}

×