Videogame com manivela traz lições para o Brasil

Leia a coluna da semana de Ronaldo Lemos para Folha de S.Paulo.

publicado em

31 de janeiro de 2023

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Playdate é verdadeira aula sobre industrialização e inovação

Playdate é o nome de um simpático videogame portátil que cabe na palma da mão. O aparelho tem uma pequena manivela que funciona como um dos controles dentro dos jogos. Em um dos games, quando a manivela é girada para frente, o personagem viaja para o futuro. Se girada para trás, viaja para o passado.

O Playdate é capaz de dar uma verdadeira aula sobre o tema industrialização e inovação para o Brasil. O console foi desenvolvido como o primeiro projeto de hardware da empresa de games Panic, sediada no estado de Oregon, nos EUA (criadora do universalmente aclamado “jogo do ganso”). Assim que foi lançado, o Playdate vendeu 20 mil unidades em 20 minutos, a US$ 179 cada um.

Esse sucesso extraordinário trouxe também desespero. Como fabricar centenas de milhares de unidades para dar conta da demanda gigantesca? Os EUA há muito tempo deixaram de ser competitivos na fabricação de hardware. A empresa olhou então para parceiros na Ásia capazes de fabricar o aparelho com preço bom, qualidade e rapidez.

O país escolhido para isso foi a Malásia, mais precisamente a cidade de Sungai Petani, que se converteu em um polo industrial. A Malásia, apesar de ainda ser economicamente menor que o Brasil, produz cerca de 29 bilhões de semicondutores em silício e arsenieto de gálio por ano, com crescimento anual de 10%. O país participa hoje de cerca de 80% do back-end da produção de chips globalmente. Quais fatores colocaram a Malásia nesse lugar? O Brasil deveria estudar isso atentamente ao pensar o tema “reindustrialização”. Como um país em desenvolvimento conseguiu ocupar um lugar estratégico dessa magnitude?

Mas voltemos ao Playdate. Outra inovação do aparelho é que você não compra os jogos, você assina o serviço (em um modelo semelhante à Netflix). A cada duas semanas o aparelho recebe um novo jogo surpresa. É uma forma de manter os clientes encantados e a receita constante. Além disso, a empresa criou um kit de desenvolvimento de jogos aberto. Qualquer desenvolvedor pode criar games para o aparelho. Sabe qual a linguagem de programação em que os jogos são feitos? Lua, a linguagem brasileira criada no Tecgraf da PUC-Rio. Ou seja, o Brasil tem uma participação também no desenvolvimento do Playdate.

Se o Brasil quiser se reindustrializar para valer, vai precisar olhar para casos globais como esses. Entender como hardware e software estão se unindo e em quais partes pode ser competitivo. Em games e design o país já mostrou que é bom de briga, como prova a existência de uma empresa de jogos brasileira como a Wildlife. Mas, se o país quiser ocupar um papel relevante na indústria, precisa projetar qual caminho deseja trilhar. Decidir o que pode fazer localmente e o que pode ser alavancado por meio de cadeias produtivas globais, como fez o Playdate.

O percurso que a Panic percorreu para criar seu primeiro videogame nos obriga a pensar com cuidado sobre o significado do termo “reindustrialização” hoje. Podemos olhar para esse tema com uma perspectiva inovadora, alavancando a produção nacional com cadeias globais. Ou para o passado, tentando manter um modelo industrial estático. Girando a manivela para frente ou para trás.

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