Quem é contra a responsabilização de plataformas pelo conteúdo publicado?

Coluna de Carlos Affonso Souza no Uol Tilt.

publicado em

19 de dezembro de 2024

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STF debate a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet, que atualmente limita a responsabilidade das plataformas apenas após descumprimento de ordem judicial

Enquanto o STF se prepara para retomar nessa semana o julgamento sobre a responsabilidade das plataformas digitais, uma pesquisa encomendada à Genial/Quaest revelou que 60% dos brasileiros acreditam que as plataformas devem ser responsabilizadas pelos conteúdos nelas publicado.

Considerando o grau de complexidade do tema e a abrangência da pergunta formulada, chama atenção que apenas 60% dos entrevistados tenham dito que sim. Para 31% dos entrevistados as plataformas digitais não deveriam ser responsabilizadas pelos conteúdos publicados, enquanto 9% não souberam ou não responderam.

A pesquisa e o julgamento

O resultado da pesquisa vem sendo apresentado como um elemento de suporte à direção que começa a se consolidar no Supremo Tribunal Federal a favor da revisão do modelo de responsabilidade civil de plataformas digitais.

O artigo 19 do Marco Civil da Internet, cuja constitucionalidade está sendo debatida no STF, determina que, em regra, as plataformas apenas respondam depois de descumprirem decisão judicial que ordena a remoção de conteúdos. Existem exceções à regra (como para conteúdos íntimos divulgados de forma não consentida) e as empresas podem moderar publicações antes da expedição de uma ordem judicial.

A lei poderia ser aperfeiçoada para estimular as plataformas a moderar de forma mais transparente e criteriosa. Isso poderia ser feito de várias formas, inclusive através de mudanças no regime de responsabilização, trazendo mais hipóteses para o modelo de responsabilidade após o descumprimento de notificação (ao invés de ordem judicial), como ocorre com a divulgação de conteúdos íntimos.

Mas nada disso consegue entrar na formulação de uma pergunta simples e direta, típica das pesquisas de opinião.

Considerando o contexto brasileiro, que inclui a percepção pública sobre o papel das plataformas no 08 de janeiro e o desafio à Justiça brasileira feito por Elon Musk, o resultado a favor da responsabilização parece até ter ficado aquém.

Ainda mais considerando a abrangência da pergunta e suas implicações políticas. Plataformas digitais – muito também por sua culpa – andam desaplaudidas em ambos os espectros políticos. Para a esquerda as redes sociais removem menos conteúdos do que deveriam, deixando no ar publicações que causam danos. Para a direita, as plataformas removem mais do que deveriam, cruzando a linha da liberdade de expressão e prejudicando pautas conservadoras.

Eleitores de Lula e Bolsonaro apoiam alguma responsabilização

Nesse ponto chama atenção o resultado da pesquisa, que revela que tanto eleitores de Lula como de Bolsonaro são favoráveis à responsabilização das plataformas, residindo aqui talvez a única diferença mais significativa entre todos os parâmetros da pesquisa (como gênero, escolaridade e renda).

Eleitores de Lula apoiam a responsabilização mais enfaticamente (com 66% dos entrevistados), enquanto esse número cai para 55% entre eleitores de Bolsonaro (com 37% dos entrevistados bolsonaristas respondendo negativamente).

Vale indagar se, em especial do lado bolsonarista, a resposta dada à pergunta revela mais um descontentamento com a política de moderação das plataformas do que uma convicção de que elas devam ser responsabilizadas. Ou talvez essa resposta mais tendente à responsabilização tenha captado um sentimento compartilhado por pessoas mais conservadoras de que existem muitos conteúdos vistos como problemáticos nas redes (em especial relacionados a pautas sobre costumes).

Seja como for, dada a abrangência da pergunta, que não entra em qualquer detalhe sobre tipo de conteúdo ou atuação das plataformas, a pesquisa da Genial/Quaest revela uma aceitação da ideia de responsabilização, só não se sabe bem qual e como. Isso o STF vai dizer.

Quem é contra a responsabilização das plataformas?

Considerando a má reputação de algumas das grandes empresas de tecnologia, somada ao contexto brasileiro cada vez mais refratário ao discurso das big tech, e a enorme abrangência da pergunta, o resultado na marca dos 60% favoráveis à responsabilização acaba jogando luz em quem não foi com a maioria.

Quem são as pessoas que acham que as redes sociais não devem responder pelo conteúdo nelas publicado?

Embora a pesquisa não traga grandes discrepâncias entre os parâmetros indicados, é possível traçar um perfil de quem respondeu negativamente.

Esse grupo está mais localizado mais nas regiões Sul e Centro-Oeste/Norte (35% e 32%, respectivamente), é ligeiramente mais masculino (32% homens x 29% das mulheres responderam negativamente), possuem entre 16-34 anos (35% dos entrevistados), sendo esse o extrato mais jovem da pesquisa, possuem mais escolaridade e têm maior renda (superior a 5 salários-mínimos).

Talvez mais importante do que revelar um apoio à noção de responsabilização das plataformas (que parece até mesmo natural), a pesquisa Genial/Quaest mostra como essa percepção é menos aceita quanto maior for a renda, a escolaridade e mais jovem for entrevistado, pegando um recorte que vai dos 16 aos 34 anos. Esse é um ponto sobre o qual deveríamos prestar atenção.

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