O 5G é o novo Sarampo

Coluna quinzenal de Fabro Steibel no jornal Zero Hora

publicado em

28 de maio de 2020

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Sobram teorias da conspiração. Como reagir? É preciso explicar a ciência de forma mais acessível.

Na Inglaterra pessoas estão ateando fogo em torres de celular 5G para lutar contra o coronavírus. Sim, existe quem acredite que a tecnologia 5G provoca a COVID-19 e motivado por isso mais de 100 torres de celular já foram queimadas. Estamos diante de uma nova teoria da conspiração, similar a que trouxe o sarampo para o século XXI.

Comparado ao sarampo o coronavírus é até pequeno. A vacina de sarampo existe desde 1806 e é comprovadamente segura. Vacinar a população mundial contra sarampo salvou só neste século 22 milhões de vidas, a maioria de crianças. Mesmo assim, há quem acredite que a vacina causa autismo, e por isso deixa de vacinar seus filhos. Resultado, o sarampo está entre nós (e se espalha 9 vezes mais rápido que a COVID).

Para quem estuda Direito, ou assistiu a Monty Phyton, sabe que na Idade Média existia um processo simples para saber se uma mulher era ou não bruxa. Motivado por fofocas ou boatos, o processo se inicia. Amarrada a uma pedra, a mulher é atirada ao fundo de um lago. Se flutuar, a bruxaria é confirmada e a mulher queimada. Se permanecer no fundo, sua inocência se confirma. Veja que nesse caso o resultado final está dado antes do início da investigação. A mulher vai morrer, mas o que legitima isso é a existência de um processo lógico por trás.

A teoria de que 5G causa coronavírus é semelhante. O boato motivador é uma coincidência temporal: as torres de celular foram instaladas pouco antes do surto da COVID. O que o conspirador faz a seguir? Inicia um processo de investigação. De costas para ciência, e para todas as entidades que pesquisam sobre isso, concluem que um dado isolado os justifica como os únicos corretos. A seguir, acendem tochas e queimam torres de celular.

O processo inquisitório fez muitas vítimas. E a pós-verdade está nos trazendo um cenário parecido. 140 mil pessoas morreram de sarampo ano passado, um recorde centenário. Agora são as torres de celular e um dia será o seu vizinho ou você. Existe uma lógica pela qual em políticas públicas separamos a astrologia – que prevê seu futuro amoroso – da astronomia, que possui cálculos que explicam o movimento das marés. E que permaneça assim, porque faz sentido orientar nossa vida por um mapa astral, mas seria incoerente propor vacinar crianças de Áries, e isolar adolescentes de Escorpião.

As torres de 5G ainda não existem no Brasil, então por enquanto estamos mais protegidos. Mas sobram nas redes sociais teorias da conspiração sobre a COVID. Como reagir a isso? Na dúvida, não compartilhe. E se tiver abertura, converse. E aos cientistas do Brasil, um chamado aparece. É preciso explicar a ciência de forma mais acessível, pelas redes sociais e com diálogo. Vejam o que Atilia Iamarino e outros estão fazendo, por exemplo. Teses e dissertações são ótimas, mas o antídoto contra as teorias de conspiração são mais vídeos no Youtube e canais no Instagram. Nunca a ciência foi tão convidada a ir para rua, ainda mais agora que as pessoas tem que ficar em casa.

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