Cibersegurança e ‘5G caviar’: não é só metaverso que deve bombar este ano
Leia a coluna de Carlos Affonso Souza para o UOL
publicado em
26 de dezembro de 2021
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O que vai marcar 2022 no campo da tecnologia? Muitas das tendências que devem dar o tom nesse ano são decorrências de fatos ou temas que dominaram os anos anteriores, como a chegada do 5G e o debate sobre como regular as fake news. Por outro lado, esse ano promete não apenas o aprofundamento de pautas, mas também o começo de discussões que podem mudar sensivelmente o modo como nos comunicamos, nos informamos e nos divertimos.
Quer uma lista do que pode mudar (ou começar a mudar) na sua vida por conta dos avanços da tecnologia e seus impactos na sociedade em 2022? Seguem as nossas apostas. Algumas olham para tendências globais enquanto outras focam no cenário brasileiro.
1. Metaverso não está pronto, mas ele já chegou
O metaverso encabeça todas as listas de tendências para 2022, mas isso não quer dizer que você vai mergulhar na realidade virtual e interagir com seus amigos e colegas de trabalhos em lindos espaços renderizados em 3D até dezembro. É importante colocar o metaverso em contexto.
De início vale lembrar que ainda não estão prontos os softwares e os hardwares que vão permitir esse tipo de interação. Em 2022 vamos ver uma corrida maluca de diversas empresas em busca das primeiras versões do que poderia ser um metaverso de verdade.
O Facebook parece ter saído na frente ao anunciar a mudança de nome para Meta em 2021, mas vale lembrar que Apple e Samsung têm uma família de dispositivos que poderia facilitar o ingresso de usuários nessa aventura.
Não podemos esquecer da Epic Games (dona do Fortnite) e da Roblox, que com seus jogos e plataformas começam a explorar modelos de interações online que vão da construção de cidades à balada virtual com direito a show da Ariana Grande.
Os equipamentos de acesso ao metaverso ainda não existem, mas o processo de virtualização das nossas experiências segue em altíssima velocidade. Pergunte para qualquer pré-adolescente que cresceu jogando Minecraft. Eles já estão preparados para o metaverso.
2. Saudade do presencial não vai desacelerar o virtual
Maldita ômicron! Quando parecia que a pandemia de covid-19 estava arrefecendo, lá veio uma nova variante para nos jogar de novo no trabalho, no estudo e nas relações intermediadas pelas telas dos celulares e dos computadores.
Muita gente se acostumou com essa vida, mas quase dois anos de restrições fizeram com que a saudade dos encontros presenciais batesse mais forte.
O tal do modelo híbrido veio para ficar. A nossa vida não vai se tornar menos digital daqui para frente. Ao contrário, quando os encontros, as reuniões e as aulas presenciais voltarem para valer, vai sempre existir um componente virtual que tende a se tornar cada vez mais importante.
Escolas não sabiam se conseguiriam dar aulas online e empresas não sabiam se conseguiriam funcionar no esquema de home office. A pandemia ensinou várias lições e elas agora vão fazer parte do nosso dia a dia. Existem vantagens e desvantagens, mas é preciso –de uma vez por todas– dar boas-vindas ou fazer as pazes com o componente virtual de nossas vidas.
3. Games são diversão, mas também investimento
Que mundo é esse em que existe analista de investimento que dá dicas sobre em qual game você deve colocar o seu dinheiro?
Foi-se o tempo em que as horas gastas em um game serviam apenas para divertir e melhorar as suas habilidades no jogo. Agora quanto mais você joga mais você pode ganhar.
Os games de NFT (non-fungible tokens) fazem parte de uma tendência maior que estourou em 2021: a tokenização de tudo. Imóveis, obras de arte e carros, assim como memes, vídeos esportivos e itens de games viraram tokens únicos, que podem ser comercializados.
Um novo mercado surgiu e muitos especularam que isso seria uma grande alucinação coletiva ou um efeito colateral do confinamento gerado pela pandemia.
Acontece que o mercado dos NFT veio para ficar e o seu casamento com a indústria dos games, que só faz crescer na última década, é bastante promissor. Em 2022 poderemos ver os primeiros jogos de NFT que furam a bolha dos iniciados e chegam ao conhecimento de um público maior.
Axie Infinity, Mir4 e Thetan Arena fizeram algum barulho no ano passado, mas o setor ainda tem mais perguntas do que respostas.
Saber em qual game investir seu tempo e dinheiro é sempre um desafio. Para além de esquemas cabulosos, alguns projetos de game parecem impressionantes no papel, mas vai saber se eles vão realmente deslanchar quando estiverem prontos.
Um caso que chama atenção nesse sentido é o Star Atlas, que promete gráficos de cair o queixo e uma ambientação envolvente no melhor estilo das “óperas espaciais”. Ele oferece para os seus investidores uma série de acessos privilegiados, além de “experiências VIP no metaverso”.
Se funcionar ele pode levar os jogos de NFT para um outro patamar. Se for só marketing e os jogadores perderem seus investimentos, fica a lembrança do cartaz do filme “Alien, o Oitavo Passageiro”: “no espaço ninguém escuta os seus gritos”.
4. 5G será muito anunciado, mas poucos terão acesso
É 5G caviar que chama. Nunca vi, nem comi, só ouço falar. E pode se preparar para ouvir bastante. As empresas de internet móvel devem usar e abusar das menções ao 5G em seus comerciais para passar aquela impressão de que o futuro chegou para todos.
Mas será que você vai ter acesso ao 5G na sua cidade?
O edital do leilão do 5G, ocorrido no ano passado, previa a chegada da cobertura nas capitais até julho de 2022. Mas isso não significa dizer que essa cobertura será integral.
Assim como vimos com o 4G, é muito provável que o 5G chegue antes em certas partes das cidades do que em outras. A instalação dos equipamentos e a atratividade da região, mesmo nas capitais, pode prejudicar a sua distribuição.
Para municípios com mais de 30.000 habitantes o edital prevê a implementação do 5G até 2029. Se essa coluna resistir até lá prometo inserir na lista das tendências tecnológicas desse longínquo ano.
5. A escassez de chips vai continuar
É como se o mundo todo fizesse parte do meme de 2009 e gritasse: “Pedrooo, cadê meu chip?!?”. Só que agora se trata dos chips semicondutores.
A paralisação na produção desses chips por conta da pandemia continua a fazer estragos pelo mundo afora, já que cada vez mais novos aparelhos dependem deles para funcionar. E isso vai de celulares a carros, de televisores a consoles de videogame.
Com atrasos acumulados na linha de produção, são vários os setores que enfrentam falta de produtos e aumento nos preços das unidades disponíveis.
Existem planos para a construção de novas fábricas nos Estados Unidos, mas enquanto isso não acontece o problema da escassez de chips vai continuar a mexer com os mercados e com o bolso dos consumidores em 2022.
Tal qual a ex-namorada do Pedro, que conseguiu reaver o chip que tanto queria – segundo revelou o mesmo em entrevista ao UOL – um dia nós teremos nossos chips de volta.
6. Desinformação em todo lugar, inclusive na TV
As redes sociais não inventaram as fake news, embora o tamanho e a visibilidade do fenômeno da desinformação tenham crescido com a rede mundial de computadores. Acontece que o problema não está só na infraestrutura técnica, mas sim nos interesses, nas convicções e nos hábitos das pessoas que produzem, compartilham e consomem desinformação.
As eleições presidenciais nos EUA, em 2016, que terminaram com a vitória de Donald Trump, ficaram conhecidas como um marco no uso político das redes sociais para desinformar. Mas será que o ecossistema informacional que gerou esse resultado não é mais amplo?
No livro Network Propaganda, três influentes professores de Harvard argumentam que o cenário de radicalização da política norte-americana em 2016 foi fomentado de maneira importante pela televisão (e em especial pela TV a cabo).
No caso brasileiro estamos acostumados a inserir a comunicação via WhatsApp (inclusive com o disparo em massa de mensagens) como um dos elementos que marcou a eleição de 2018. Uma aposta para o cenário eleitoral de 2022 é ficar de olho em um conjunto mais diverso de meios pelos quais a desinformação se espalha, incluindo televisão, rádio e mesmo jornais.
7. Apps como o Telegram poderão ser suspensos
Existem vários fatores que podem colocar o Telegram na mira das autoridades brasileiras em 2022. O aplicativo permite a criação de grupos com centenas de milhares de pessoas e modera conteúdos e contas de forma restrita. Como resultado, algumas postagens que poderiam muito bem ser encontradas na deepweb acabam subindo para a superfície do Telegram.
Mas ao lado disso existe uma comunidade ativa de usuários que se vale da plataforma para o uso de ferramentas práticas, como robôs de transcrição, ou para se reunir em grupos de interesses distintos.
A limitada moderação de conteúdo no aplicativo acabou chamando a atenção de uma parcela de políticos e influenciadores que enxergaram no Telegram uma possibilidade de angariar um grupo expressivo de seguidores sem correr o risco de ter o seu conteúdo derrubado, como ocorreria em plataformas concorrentes.
Entra em cena o contexto eleitoral de 2022 e aqui fica claro como uma atuação mais expressiva da plataforma no combate à desinformação (ou mesmo na derrubada de conteúdos que violem as leis eleitorais brasileiras) vai ser demandada pelas autoridades brasileiras.
Acontece que o Telegram não parece estar disposto a cooperar. A CPI da Pandemia pode ter servido como evento-teste desse impasse, já que seus requerimentos de informações não foram considerados pela empresa.
Com a temperatura aumentando quanto mais perto se chega das eleições, não seria de se espantar se uma decisão judicial ordenasse o bloqueio da aplicação no Brasil.
Ah, e vale lembrar que um eventual bloqueio do Telegram poderia ser bem diferente dos sucessivos bloqueios do WhatsApp lá atrás em 2016.
O motivo que levou o WhatsApp a ser bloqueado foi o não cumprimento de decisões judiciais que ordenavam a entrega de conversas entre suspeitos no aplicativo. Essa medida era (e ainda é) tecnicamente impossível de ser efetivada sem quebrar a criptografia ponta-a-ponta da comunicação. A própria empresa não tinha como entregar o que a Justiça queria.
Fazendo um exercício de imaginação, eventual bloqueio do Telegram poderia advir do não cumprimento de ordem judicial que determinasse a remoção de postagem, conta ou grupo, medida que não encontra a mesma impossibilidade técnica ligada à criptografia.
Outros aplicativos que optarem por não realizar moderação de conteúdo e não cumprirem decisões judiciais brasileiras poderiam ir pelo mesmo caminho.
8. Cresce a ciberinsegurança
Os seus dados estão realmente seguros? Você confia nas medidas de segurança digital adotadas pelas empresas que armazenam e tratam os seus dados? E o que dizer do governo, que todo dia parece sofrer um novo ataque hacker importante?
Não é novidade para ninguém o fato de que a segurança digital entrou em nossas vidas para ficar. Se preocupar com esses temas faz parte da rotina de cada um de nós, passageiros que viajam ao longo do século 21.
Mas 2022 traz dois componentes importantes para a equação.
O primeiro é o resultado da frequência com a qual incidentes de segurança vão sendo reportados pela imprensa. No que diz respeito ao governo, em especial, parece que a desculpa de que “foi o hacker” virou resposta para qualquer controvérsia que envolva o manuseio de sistemas digitais.
Chega um momento em que são tantas as notícias sobre ataque hacker e vazamento de dados que —somada com o desconhecimento generalizado sobre como funciona a tecnologia—, a cibersegurança dá lugar à ciberinsegurança.
As pessoas passam a pressupor que não existe proteção possível e que a digitalização das atividades as torna essencialmente mais propensas a ataques, fraudes e incidentes de toda espécie.
O segundo elemento, igualmente preocupante, é o uso político da ciberinsegurança.
Em 2021 já vimos como essa cartada foi usada para desacreditar a lisura do processo de votação através das urnas eletrônicas, inclusive com live presidencial ancorada em vídeos amadores, conclusões equivocadas ou simplesmente falsas.
O sentimento de insegurança com os meios digitais alimenta essas narrativas e deve ser muito explorado politicamente em 2022.
9. Consolidadas, as fintechs vão às compras
O impulso na digitalização de tudo, acelerado durante a pandemia, atingiu também as relações financeiras.
As fintechs crescem a olhos vistos no país, fazendo com que as instituições financeiras tradicionais precisem se mexer. Em 2021 não faltaram aquisições por parte das principais fintechs, que começaram a adquirir empresas que pudessem adicionar novos elementos aos seus negócios, como ferramentas para gestão de investimentos, pagamentos eletrônicos ou atendimento ao cliente.
Em 2022 essa tendência deve se confirmar, com algumas das principais fintechs do país saindo às compras para fortalecer as suas operações e viabilizar novas formas de crescimento.
Olhando para o mercado internacional, o movimento de Jack Dorsey, que saiu do Twitter para comandar a Block (antiga Square), uma fintech que também ajudou a fundar, diz muito sobre o futuro da economia digital.
Cada vez mais as transações financeiras passam pela rede, seja no e-commerce, seja com a explosão dos meios de pagamento eletrônicos. As oportunidades que surgirão para as empresas que estiverem presentes nas diversas maneiras pelas quais o dinheiro circula na rede parecem infinitas.
E com tantos recursos advindos dessas operações, não vai ser estranho se essas grandes fintechs começarem a comprar empresas de outros setores, ampliando ainda mais a sua atuação.
10. Século asiático nas redes e no entretenimento
O impacto global de redes sociais chinesas, músicas e séries coreanas, além de animações japonesas, não nos deixa mentir: vivemos um século que será marcado pela expansão da influência asiática. Essa é uma aposta que vai muito além de 2022, mas cujos sinais parecem difíceis de negar.
“Round 6”, um violento drama coreano, foi a série mais assistida no Netflix em 2021. Na música, os principais grupos de K-pop continuaram a fazer a cabeça de adolescentes (e outros nem tão adolescentes assim) pelo mundo afora.
Para completar, pesquisa recente revelou que metade dos adolescentes no Brasil tem uma conta no TikTok, rede social nascida na China.
Uma aposta certeira para 2022 é que essa tendência não vai desacelerar. Podemos esperar uma presença crescente de conteúdos e de produtos asiáticos na dieta de vídeos, músicas, games e aplicativos que vão deixar a sua marca nesse ano.
Engana-se quem pensa que essa tendência é exclusiva para crianças e adolescentes. O alcance da influência asiática não conhece faixa etária, apresentando conteúdos e produtos para todas as idades. No horóscopo chinês, 2022 é o ano do tigre, um ano que será dinâmico e agitado para todos, inclusive para os tigres de bengala.
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