O desafio de governar com redes sociais

Coluna semanal do Ronaldo Lemos publicada na Folha de São Paulo.

publicado em

22 de janeiro de 2019

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Quem busca controlar pessoas por meio de redes sociais acaba por elas sendo controlado. Essa é uma das lições dos conturbados eventos da semana passada.

O senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), por exemplo, transformou a si mesmo em um “influenciador” de internet para vencer as eleições com votação épica. Aplicou todas as ferramentas para isso: exposição no Twitter, realização de vídeos ao vivo na internet, interação direta com os “fãs”, provocação direta aos adversários, participação em grupos de WhatsApp, documentação da própria vida pelo celular.

Em suma, pôs em prática todo o catálogo de meticulosas estratégias para aparentar “espontaneidade” e parecer “gente como a gente”.

Na semana passada, o senador amargou o reverso da medalha que todo influenciador da rede mais experiente conhece: boa parte da turba que ele soube muito bem provocar voltou-se contra ele. Muitos fãs se converteram em haters.

Uma usuária na sua conta de Instagram disse: “Flávio, estamos aguardando um posicionamento seu, de forma direta e transparente, como sempre se comunicou com seus eleitores e apoiadores. Essa história de nota de assessoria não nos interessa, pois nosso contato com você sempre foi direto”.

Outro disse: “Você fez diversos vídeos para pedir votos, faça um vídeo pra justificar o caso. Assim como eu, milhões de brasileiros deram ‘a cara a tapa’ para que vocês fossem eleitos”. Ele não respondeu.

O que chama a atenção nesses casos é o duplo choque de realidade que ele provoca. Os fãs do senador descobriram de repente não só que ele pode estar envolvido em uma conduta passível de investigação (o caso Queiroz) mas também que o contato com ele por meio das redes nunca foi “direto e transparente”.

Ao contrário, percebem agora que a exposição que os “influenciadores” fazem na internet é muito mais uma forma de ofuscar do que de revelar. Sua aparente “disponibilidade” para ouvir e conversar com os fãs-eleitores é totalmente fictícia.

Em 2017, escrevi a coluna “Decepção com influenciadores digitais é questão de tempo”. Os mesmos pontos desse artigo aplicam-se aos políticos-influenciadores.

Vale lembrar que influenciadores da internet são apaziguadores da solidão e falta de sentido da vida alheia. Sua força vem da indústria da carência criada pela internet, em que todos querem falar, mas poucos querem ouvir. O político-influenciador quer ocupar esse lugar impossível entre a fala e a escuta.

Por aparentar ser “gente como a gente”, dá a impressão de que está disposto a ouvir e compreender as pessoas e a responder a elas diretamente.

Só que essa é uma situação utópica. Não há condições verdadeiras para a troca, já que a desproporcionalidade é grande demais. Por isso, a relação entre os fãs-eleitores e os políticos-influenciadores rapidamente começa a degringolar; a decepção é questão de tempo.

O que era empatia converte-se em ódio. Esse é o ponto cego do marketing da influência que o senador Flávio Bolsonaro está experimentando. Seus eleitores estão percebendo que o contato que tinham com ele por meio das redes sociais é como a amizade de alguém com um amigo imaginário: não existe.

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