O que o DeepSeek pode ensinar para o Brasil

Coluna de Ronaldo Lemos na Folha de S.Paulo.

publicado em

4 de fevereiro de 2025

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De 2003 e 2010 o Brasil foi uma potência mundial em modelos open source

O choque causado pelo Deepseek traz lições para o Brasil. O ponto mais falado foi o custo: o modelo de inteligência artificial da empresa é potente e foi obtido com custo bem menor. Mas o que impressiona mais é outra questão: o Deepseek adota um modelo “open source”.

A melhor forma de entender isso é na prática. A inteligência artificial nos EUA estava seguindo o caminho da busca por monopólio. A premissa era simples: o poder da inteligência artificial seria diretamente relacionado ao tamanho da infraestrutura em que ela opera. Quanto mais chips, servidores, datacenters, dados e energia, mais poderosa a IA.

Em suma, a liderança em IA era vista como uma questão de capital. Tanto é que os EUA anunciaram um investimento de US$ 500 bilhões. E foi justamente essa premissa que o DeepSeek desmontou. A empresa mostrou que é possível construir modelos de IA com base em criatividade: novas estratégias de treinamento, otimização de recursos e assim por diante.

Ao fazer isso, o DeepSeek desafiou a liderança do desenvolvimento da IA. Uma liderança diferente, antimonopolista. A empresa tem tanta certeza de que dará saltos sucessivos de inovação que não se importa em abrir seu modelo para quem quiser copiar, distribuir, usar comercialmente e retreinar. Tanto é que o DeepSeek é licenciado através da licença open source chamada MIT License, uma das mais permissivas do mundo.

Nas palavras do fundador da DeepSeek: “Nossa vantagem competitiva está no conhecimento acumulado. Tornar o modelo open source não nos traz nenhum prejuízo. Ao contrário, como estamos liderando, isso é recompensador. Abrir o modelo é uma honra e atrai talentos”.

De 2003 a 2010 o Brasil foi uma potência mundial em modelos open source. Todos os anos a cidade de Porto Alegre sediava o Fórum Internacional do Software Livre. O resultado era impressionante: as principais empresas que trabalhavam nesse modelo se dirigiam a Porto Alegre. Muitos dos mais importantes programadores do planeta vinham anualmente ao Brasil.

O Brasil adotou o modelo open source também como política pública. Criou programas de compartilhamento de software dentro da administração pública (cheguei até a lançar um livro sobre o tema, chamado Direito do Software Livre e a Administração Pública).

Só que depois o país perdeu a mão. Abrimos mão da liderança em open source para virar um país “europeizado”. Em vez de ambicionar desenvolver tecnologia, passamos só a lutar contra ela. A tapar o sol com a peneira, copiando as leis europeias e abandonando nossas visões próprias que davam certo.

É nesse contexto que o DeepSeek é um choque também para nós. O país pode se especializar de novo em open source aplicado à inteligência artificial. Podemos criar uma lei de inteligência artificial com a ambição de proteger e fomentar os modelos abertos, transformando o país em um polo de desenvolvimento de IAs dessa natureza. É algo que honra nosso passado. E abre caminho para nos protegermos da maior de todas as ameaças: a de que fiquemos completamente de fora da competição em inteligência artificial.

Já era – Falar dos Millennials

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