Por que o Zoom cansa tanto?

Coluna semanal de Ronaldo Lemos na Folha de São Paulo.

publicado em

23 de junho de 2020

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Circulou pela rede nos últimos dias um vídeo do ministro Gilmar Mendes que captura o momento após ele participar de videoconferência por Zoom. Nos segundos finais da reunião, o ministro está ainda sorridente e cordial. Tão logo a reunião termina, sem saber que a câmera e o áudio estavam ativos, o ministro bufa alto e solta um sonoro palavrão.

Acredito que a maioria das pessoas irá se identificar com essa exasperação. O fim de uma videoconferência é realmente um momento singular, que mistura sentimentos como raiva, cansaço, estresse e alívio.

Surgiu até uma expressão em inglês para definir esse momento: “Zoom fatigue” (fadiga de Zoom), em referência à cada vez mais popular plataforma. A origem dessa fadiga tem razões que merecem análise. Fazer uma videoconferência longa com câmera ligada envolve um esforço de comunicação que não é nada natural.

Por mais que a imagem queira nos enganar que estamos olhando e interagindo com pessoas, a verdade é que não estamos olhando para ninguém, mas sim para uma tela.

Nas relações pessoais físicas, a interação em “tempo real” permite construir confiança mútua pela leitura de sinais como expressões faciais, postura corporal e o fato de os envolvidos estarem vivendo uma mesma experiência de tempo e espaço.

Já a convivência em uma videoconferência é sempre dissociativa. O tempo até pode ser o mesmo. Mas o espaço e as experiências compartilhadas são radicalmente diferentes. Uma pessoa pode estar fazendo a reunião da cozinha de casa, outra do escritório, outra do carro e assim por diante, cada uma em um contexto social e emocional totalmente distinto.

Além disso, é impossível ler com precisão os sinais de quem está do outro lado. O emissor não sabe como o receptor reage à sua mensagem. Ao mesmo tempo, todos ficam prisioneiros de um quadrado virtual fixo, determinado pela câmera.

Para piorar, há o problema de para onde olhar. Se o participante olha para a câmera, isso produz um efeito positivo no receptor, que fica com a sensação de estar sendo olhado “nos olhos”. No entanto, gera um efeito contrário no emissor, que se desconecta da expressão facial da pessoa e passa a focar não um olho humano, mas sim o minúsculo e perturbador buraco negro da câmera, posicionada no topo da tela.

Se a decisão é olhar para o rosto da pessoa, ela pode estar posicionada no canto inferior esquerdo da tela. O ouvinte se conecta aos olhos dela, mas, para quem está falando, fica parecendo que a pessoa está com o olhar enviesado. Um desencontro total. O resultado de tudo isso é o cansaço, o estresse, a raiva e a frustração causados pela artificialidade das reuniões virtuais.

Ficam aqui duas singelas sugestões para mitigar o problema. Para os designers das plataformas, quando alguém falar, coloque o quadradinho da pessoa exatamente ao lado de onde a câmera estiver, e nunca em lugar oposto a ela.

Já para todos nós, que tal combinarmos o seguinte: é totalmente aceitável fazer uma videoconferência sem ligar a câmera. Isso reduz a dissociação entre tempo e espaço, o estresse e o desencontro entre os participantes. O ministro Gilmar Mendes e eu agradecemos.

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