Você está no mudo! Liberdade para o Zoom

Coluna semanal de Ronaldo Lemos na Folha de São Paulo

publicado em

1 de dezembro de 2020

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É preciso repactuar as regras pessoais e profissionais de uso da plataforma

Trabalhadores cognitivos do mundo todo, uni-vos! É preciso repactuar uma nova forma de trabalhar pelo Zoom.

Não há a menor dúvida de que o aplicativo fundado por Eric Yuan, chinês naturalizado norte-americano, salvou o trabalho e as interações pessoais de muita gente durante a pandemia. O Zoom era a tecnologia que estava na hora e no lugar certos para o momento de recolhimento social.

Isso se reflete nos números da empresa. No segundo trimestre de 2020, reportou receita de US$ 663 milhões, um aumento de 355% em relação ao mesmo período no ano anterior. E contabilizava 300 milhões de pessoas que se conectavam a uma reunião digital diariamente.

O número de minutos gastos em reuniões online por ano saltou de 100 bilhões, em janeiro, para 2 trilhões, em abril, mais de 20 vezes.

Com tanto sucesso, o Zoom criou uma cultura própria. Se tivesse de escolher uma das frases mais marcantes de 2020, com certeza “você está no mudo” estaria nas finalistas. Só que o Zoom também traz problemas que precisam ser enfrentados, muitos deles relacionados à saúde mental no trabalho.

Primeiro, vale dizer que, se você trabalha por Zoom, faz parte de uma camada privilegiada. No Brasil, há 70 milhões de pessoas que não têm conexão de internet suficiente para fazer uma reunião sequer no Zoom. Tanto é que só 10% da população entrou em regime de home office. Então essas questões dizem de fato respeito a um segmento específico da população no país.

Feitas essas qualificações, o primeiro ponto é que a fadiga de Zoom é real. Poucas são as aplicações da rede capazes de exigir tanta atenção. Para quem usa a plataforma de modo intensivo, o quadrado da câmera do computador torna-se uma espécie de gaiola. Se a reunião é longa, então, a experiência vai se tornando progressivamente excruciante. A exigência de foco vai ficando cada vez mais difícil de ser cumprida.

Um dos sintomas dessa fadiga é a famosa “bufada” que a maioria das pessoas dá quase sem pensar quando uma videoconferência termina. Na internet, há uma coleção de vídeos de pessoas flagradas fazendo isso (um bom parceiro de “você está no mudo” é o toque amigo “sua câmera está ligada”).

O que fazer? O problema da fadiga do Zoom é tanto tecnológico como social. Já escrevi sobre os aspectos tecnológicos em outra coluna aqui. Já quanto aos aspectos sociais, é preciso repactuar as regras pessoais e profissionais de uso da plataforma.

A começar pela exigência de manter a câmera ligada o tempo todo. Essa exigência é muito mais para exercer controle do que comunicação. Não faz sentido exigir que um grupo enorme de pessoas fique em silêncio fitando uma câmera minúscula enquanto só uma pessoa fala.

O segundo ponto é que precisamos combinar uns com os outros que é totalmente ok dar atenção apenas parcialmente a uma videoconferência. Nesse sentido, deveria ser aceitável que uma pessoa, ao lhe ser perguntado subitamente sobre algo que está sendo discutido, possa dizer: “Desculpe, não estava prestando atenção. Podem repetir a pergunta e o ponto em discussão?”.

Essa repactuação social tiraria um enorme peso de plataformas como o Zoom. A saúde mental agradece. Eu também.

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