6 Leituras Indispensáveis sobre Direitos Autorais e Inteligência Artificial

Por Pedro de Abreu M. Campos

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Entenda o presente e o futuro da criação cultural

Uma boa análise exige distanciamento emocional do objeto estudado. Essa é a essência de uma das mais célebres frases de Pierre Bourdieu: “Os circuitos de consagração social serão tanto mais eficazes quanto maior a distância social do objeto consagrado.” Embora Bourdieu se referisse principalmente à crítica de arte e cultura, essa ideia também pode ser aplicada à compreensão dos acontecimentos históricos.

 

A percepção do tempo e da história é um tema debatido há séculos. Reinhart Koselleck, um dos historiadores mais influentes do século XX, introduziu dois conceitos cruciais a esse tema: Espaço de Experiência e Horizonte de Expectativa. O primeiro refere-se ao conhecimento presente que uma sociedade ou indivíduo extrai das experiências históricas passadas, enquanto o segundo diz respeito às projeções, previsões, expectativas e esperanças em relação ao futuro.

 

Não por acaso, muitas vezes, eventos históricos recentes são mal compreendidos, subestimados ou até mesmo ignorados. Enquanto a sociedade está imersa nesses eventos, o Horizonte de Expectativa é contaminado pelos próprios anseios e temores, ao passo que o Espaço de Experiência ainda não teve tempo de se formar plenamente. Logo, por mais honesta que seja, a análise torna-se inevitavelmente incompleta e enviesada.

 

Ainda assim, mesmo sabendo da impossibilidade de compreender verdadeiramente a Greve dos Roteiristas dos EUA de 2023 como acontecimento histórico, é difícil resistir à tentação de identificá-la como o marco de uma nova era de debates e preocupações acerca dos impactos éticos, sociais, trabalhistas e artísticos das inteligências artificiais. Afinal, foi a primeira movimentação social impactante e organizada a reivindicar com algum possível sucesso o uso consciente de ferramentas de IA generativas.

 

Entre tantas grandes preocupações, os impactos regulatórios dos direitos autorais e sua interação com as inteligências artificiais podem parecer insignificantes. No entanto, talvez poucos discordem de que as formas de produção cultural influenciam profundamente a sociedade, seja através da formação de identidades, da expressão de valores e ideologias, do acesso à educação e conhecimento, de  estratégias de soft power ou até mesmo das concepções de inspiração e de criatividade.

 

Se os direitos autorais regulam de alguma forma a produção e o acesso à arte, literatura e ciência, então os impactos sociais profundos dos direitos de exclusividade sobre as obras são inegáveis. Considere-se, por exemplo, um acontecimento histórico razoavelmente distante que já permite formular análises mais elaboradas.

 

Antes de 1891, os Estados Unidos não conferiam direitos autorais a escritores estrangeiros. Consequentemente, editoras norte-americanas podiam reproduzir e comercializar obras estrangeiras livremente, sem pagamento de royalties. Essa escolha regulatória gerou impactos mercadológicos e sociais, tornando autores estrangeiros massivamente populares nos EUA, pois seus livros eram mais acessíveis aos consumidores norte-americanos.

 

Se, por um lado, o maior acesso às obras estrangeiras parecia benéfico, por outro, trouxe desafios para os autores norte-americanos que não conseguiam competir em pé de igualdade com os estrangeiros. Em alguma medida, esse desenho regulatório dificultou a formação cultural literária norte-americana. Não seria correto afirmar que a produção literária dos Estados Unidos  era frágil antes de 1891, quando os direitos autorais de estrangeiros passaram a ser protegidos. Contudo, não parece coincidência que, após 1891, tenham surgido alguns dos principais nomes da literatura norte-americana, como Mark Twain, Walt Whitman e Herman Melville.

 

Não é possível prever como as inteligências artificiais se desenvolverão no mundo, nem como impactarão a ética, a educação, o mercado de trabalho, a produção cultural e a indústria criativa em geral. Porém, é possível afirmar com alguma segurança que a regulação dos direitos autorais, mesmo que passe despercebida por grande parte do público, terá um papel crucial no desenrolar social que está por vir, assim como ocorreu na literatura norte-americana do século XIX.

 

As discussões estão em aberto e vão desde a compreensão de como regular o output supostamente criativo de uma inteligência artificial, até o debate sobre se a inclusão de obras como input deve ser considerada uma infração de direitos autorais.

Aqui estão seis trabalhos que ajudam a refletir sobre o tema:

1) SCHIRRU, Luca. Direito Autoral e Inteligência Artificial: Autoria e titularidade nos produtos da IA. 2020. Tese disponível aqui.

Esta tese é uma referência essencial em português sobre direitos autorais e IA, discutindo profundamente autoria e titularidade em criações feitas por inteligência artificial.

2) CAMPOS, Pedro de Abreu M. Direitos Autorais de acordo com o STJ. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2022.

Este livro abrange uma ampla gama de tópicos sobre a proteção de direitos autorais no Brasil, com especial atenção à jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e questões relacionadas à pessoa humana.

3) SGANGA, Caterine. : The Past, Present and Future of EU Copyright Flexibilities. In: DERCLAYE, Estelle (ed.). Research Handbook on the Future of EU Copyright. 2009.

Esta obra explora a função dos direitos autorais no ecossistema digital, analisando os direitos dos usuários e as questões concorrenciais em um contexto internacional e comparativo.

4) ABBOTT, Ryan. ROTHMAN, Elizabeth. Disrupting Creativity: Copyright Law in the Age of Generative Artificial Intelligence. In: WATT, Richard (ed.). Handbook on the Economics of Copyright. 2014.

O capítulo discute os desafios que a inteligência artificial apresenta para o conceito tradicional de autoria e se a IA pode tornar os direitos autorais obsoletos.

5) ROSATI, Eleonora. “Copyright and the Court of Justice of the European Union“. 2019.

Este livro fornece uma análise detalhada das decisões do Tribunal de Justiça da União Europeia, examinando como essas decisões influenciam a interpretação e aplicação dos direitos autorais em relação à IA.

6) LEMLEY, M. A.; CASEY, B. “Fair Learning.“.2020. Disponível aqui.

Este artigo aborda as implicações legais e os desafios apresentados pelo uso de obras protegidas por direitos autorais no treinamento de algoritmos de aprendizado de máquina, discutindo a necessidade de equilibrar direitos e inovação tecnológica.

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