Direitos Humanos e Criptografia

Série da UNESCO sobre Liberdade na Internet.

categorias

{{ its_tabs[single_menu_active] }}

tema

tradução: ITS Rio

Obra publicada pela UNESCO, de autoria do Prof. Wolfgang Schulz e Dr. Joris Van Hoboken. A equipe do Instituto de Tecnologia e Sociedade foi responsável pela tradução para o português.

Este estudo concentra-se na disponibilidade e no uso de uma tecnologia de particular importância no campo da informação e comunicação: encriptação ou, mais amplamente, criptografia. Nas últimas décadas, a encriptação provou ser especialmente adequada para uso em ambientes digitais. Ela foi implementada de forma abrangente por diversos atores para garantir a proteção da informação e da comunicação, procurando atender a interesses comerciais, pessoais e públicos. Do ponto de vista dos direitos humanos, há um crescente reconhecimento de que a disponibilidade e a utilização da encriptação por atores relevantes são ingredientes necessários para a concretização de uma Internet livre e aberta. A encriptação pode, sobretudo, amparar a liberdade de expressão, o anonimato, o acesso à informação, a comunicação privada e a privacidade. Portanto, as limitações na encriptação precisam ser cuidadosamente examinadas. O presente estudo aborda a relevância da encriptação para os direitos humanos na mídia e no campo da comunicação, e a legalidade das interferências, apresentando recomendações para a prática do Estado e de outras partes interessadas.

Esta publicação explora essas questões no contexto da nova abordagem da UNESCO em relação à Internet. A abordagem foi adotada pelos nossos 195 Estados-membros em novembro de 2015 e tem por fundamentação o Documento Final de uma conferência anterior denominada “Connecting the Dots” (Conectando os Pontos). Na prática, isso significa que a UNESCO defende o conceito de “Universalidade da Internet” e os respectivos “princípios ROAM” que dizem respeito a uma Internet baseada em direitos (humanos), aberta e acessível, que seja regulada por uma participação multissetorial.

Na Seção 2, o estudo fornece uma visão geral sobre encriptação como um elemento cada vez mais essencial do cenário de mídia e comunicações, fazendo uma distinção entre a encriptação implementada pelos provedores de serviços e a utilizada diretamente pelos usuários finais. O estudo também esclarece a diversidade de propriedades da informação e comunicação que a encriptação pode ajudar a garantir, incluindo confidencialidade, privacidade, autenticidade, disponibilidade, integridade e anonimato.

Na Seção 3, o estudo explica como a implantação de tecnologias e soluções de encriptação é afetada por diferentes áreas da lei e política relacionadas à informação, incluindo a lei do comércio eletrônico, lei de proteção de dados e acesso do governo a dados e comunicações. A questão do projeto de backdoors de encriptação, sob a ótica do acesso governamental legal, é considerada, assim como o desenvolvimento de 9 normas em nível internacional, por meio de orientações da OCDE e dos relatórios oficiais dos Relatores da ONU.

A Seção 4 oferece estudos de caso mais detalhados sobre o estado atual da política de encriptação em jurisdições selecionadas (Alemanha, Estados Unidos, Índia, Brasil e região africana). Esses estudos de caso analisam a política de encriptação vista da perspectiva de uma tipologia geral de restrições à encriptação (por exemplo, controles de exportação), bem como medidas positivas para estimular a disponibilidade e adoção da encriptação (por exemplo, na regulamentação da privacidade de dados). Em nenhuma das jurisdições selecionadas existe uma proibição definitiva acerca do uso de encriptação, mas o grau de liberalização da política de encriptação para uso do setor privado é diferente. Mais especificamente, pode haver uma incerteza significativa sobre o status legal preciso da encriptação, que funciona, de fato, como limitação sobre seu uso. O estudo também discute propostas recentes nos Estados Unidos e em outros lugares que restringiriam a disponibilidade de encriptação segura para usuários da Internet, tendo em vista o acesso do governo à informação e comunicação.

A seção 5 discute as implicações da encriptação para direitos humanos e mídia, e comunicações. Limitações na encriptação interferem potencialmente no direito à liberdade de expressão e no direito à vida privada, protegidos em âmbito internacional. O estudo promove três perspectivas específicas de preocupação a esse respeito.

Primeiro, a encriptação dá suporte ao requisito de comunicações sem restrições, permitindo que as pessoas protejam a integridade, disponibilidade e confidencialidade de suas comunicações, que seriam vulneráveis se realizadas de outra forma. Esse requisito é uma condição prévia importante para a liberdade de comunicação e precisa encontrar forte reconhecimento em âmbito internacional.

Segundo, quando a política ou legislação provocam limitações na encriptação e suas propriedades de segurança, devem ser observadas as garantias processuais, incluindo o princípio da transparência. Isso é particularmente relevante para a situação na qual os Estados não tomam medidas formais, mas contam com a cooperação de atores privados e da indústria para implantar medidas que afetam a encriptação.

Em terceiro lugar, o estudo observa o importante papel dos provedores de serviços intermediários na proteção da experiência dos usuários em suas plataformas. Especificamente, intermediários online não apenas têm o papel de intermediários em relação ao conteúdo e conexão de usuários, mas também um dos intermediários de segurança, considerando que suas práticas e padrões de encriptação são altamente relevantes para o acesso e uso efetivo dessas tecnologias pelo usuário.

A Seção 6 oferece recomendações como insights que podem ser úteis para várias partes interessadas, de forma a abordar adequadamente as questões de direitos humanos envolvidas. As recomendações visam diferentes grupos de partes interessadas e o papel específico que desempenham no sistema geral, incluindo governos, organizações internacionais, comunidade técnica, setor privado, sociedade civil, usuários e academia. Em suas recomendações, o estudo observa a falta de sensibilização para as questões de gênero no atual debate e na política existente em relação à encriptação e à necessidade de abordar a posição das comunidades vulneráveis.